Diz-se que Heráclito assim teria respondido aos estrangeiros vindos na intenção de observá-lo. Ao chegarem, viram-no aquecendo-se junto ao fogo. Ali permaneceram, de pé, (impressionados sobretudo porque) ele os encorajou a entrar, pronunciando as seguintes palavras: 'Mesmo aqui, os deuses também estão presentes'. (Aristóteles. De part. anim. , A5 645a 17ff).

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

Amamos o pecador, mas odiamos o pecado.


Este post poderia ter o subtítulo: “Relembrando a Santa Inquisição”. Mas, a frase que lhe dá título serve bem para ilustrarmos como raciocinam os fundamentalistas religiosos de plantão. Eu a tenho ouvido / lido quase diariamente em minhas discussões sobre a dignidade e os direitos da população LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros), como se fosse um argumento irrefutável – ao lado da liberdade de crença e culto, que já analisamos anteriormente – para a não aprovação do PLC 122/2006 que criminaliza a homofobia.

A questão toda se resume nisso: amamos o pecador, mas como está em pecado ele não tem direito a estabelecer uma parceria civil, não tem direito a adotar, não tem direito a ser protegido pelo estado (em caso de sofrer qualquer tipo de violência por sua orientação de gênero), não tem direito a plano de saúde compartilhado ou à herança. De fato, o pecador não tem direito de existir! Foi assim que pensaram os “santos inquisidores”, tão mal compreendidos historicamente! Afinal, eles amavam o pecador, odiavam apenas o pecado. E, assim, agindo segundo a mais alta caridade cristã, condenavam outros seres humanos à morte na fogueira, não sem antes uma boa tortura, para amaciar o moral e ser liberto pela verdade. A escolha da fogueira era mais um golpe de sua imensa misericórdia e amor pelo pecador. A morte era lenta, assim havia a chance de, diante da dor, o pecador se arrepender e ter sua alma imortal salva no último instante.

Esse é o mesmo quadro que vislumbramos hoje. As bancadas religiosas amam tanto os pecadores homossexuais que desejam, do fundo de seus corações misericordiosos, que estes cidadãos e cidadãs sofram cada vez mais preconceito, discriminação e violência. Quem sabe assim eles não se arrependam de suas vidas pecaminosas e se salvem. Quem sabe assim a pseudo-psicóloga Rosângela Justino tenha de volta seu registro no Conselho Nacional de Psicologia, e seu ganha-pão, com o aumento de indivíduos arrependidos. Se alguns gays e lésbicas morrerem no meio do processo, tudo bem, são baixas de guerra: a guerra contra o pecado.

O que me assusta em meio a toda essa discussão é a facilidade com que lidamos com seres humanos a partir de categorias tão equivocadas como a de “pecadores”. Mas, é mais fácil. Uma categoria não pensa, não sente, não ama, não sofre… Uma categoria é apenas isso, uma categoria. Esquecemos tão prontamente que o que está em discussão com essa lei são direitos individuais das pessoas que tudo toma caráter meramente ideológico.

2 comentários:

Diálogo de Pedras disse...

Muito consistente o seu texto. A humanidade está infectada mortalmente pelo preconceito e pela dominância através da força bruta.

Que o homem nunca venha a povoar outros planetas. Dessa forma não espalhará seus "pecados".

Augusto Araujo disse...

Oi Roberto, valeu pelo comentário. Espero que continue gostando e visitando as "Mansões". Forte abraço!